Aceite seus sonhos...

 


Tem assuntos que precisam ser ditos em voz alta para que façam um sentido real.

Tenho sonhos e vontades dentro de mim, que nunca disse para uma amiga ou uma terapeuta por medo de encarrar uma nova realidade que eu não havia planejado em meus dias, quem me conhece muito bem sabe que sempre fui muito desapegada a criar laços longos. Sempre vivi muito o agora e sempre achei mais fácil e menos doloroso porque aí não me decepcionaria com planos que deram errado.

Ainda jovem pensava naquela vida planejada, estudar, trabalhar, ser reconhecida, encontrar uma alma gêmea, casar e ter uma família, mas tudo isso se tornou apenas segundas opções e sonhos distantes quando eu achei que ser feliz era uma forma de viver e esquecer pessoas. Aos vinte e quatro anos eu lidei com a primeira e importante perda da vida, minha avó morreu e se a gente analisar é o ciclo da vida, e mesmo sabendo todos os dias que as pessoas se vão, nós de fato nunca estamos prontos para essas despedidas eternas, foi um ano de novas descobertas, muitas saudades e muito questionamento a Deus e ao universo, e ao mesmo tempo foi o melhor ano que passei ao lado da minha mãe, e também nosso último. Eu só tinha vinte e cinco anos quando minha mãe morreu exatamente nos meus braços e ali eu achei que era só abrir os olhos e pronto me tornei adulta e responsável. Eu me fechei, me travei, me tranquei no meu mundo, porque ser feliz para mim sem ela aqui era errado – na minha cabeça -, realizar sonhos sem ela aqui me fazia sentir uma filha traidora. Eu pensava que nunca nada mais na vida teria um sabor e realização se ela não pudesse me ver alcançar. Como se eu sempre tivesse que dividir meus bons momentos em dois, um para curtir e um para estar triste porque ela não podia participar. Quando terminei a faculdade apenas senti alivio por cumprir um papel social, porque na minha cabeça se eu não tivesse pensado tanto eu teria terminado os vinte e três e ela estaria aqui para comemorar junto. Eu desisti de viver o roteiro, eu não quis mais realizar sonhos, porque mesmo me deixando feliz, me destruía toda vez não ter ela ao meu lado.

Até uns dias atrás eu achava que casar e ter filhos eram coisas que eu não queria viver, mas a verdade é que fechando os olhos, o que queria mesmo era quando fosse me casar ela estaria ao meu lado nesse dia tão importante e então eu fui adiando, fui vivendo e me afastando de momentos que julgava que seriam impossíveis viver sem ela. Quando minha irmã engravidou eu tinha planos de ir morar fora, mas como nossa mãe não estaria aqui por ela eu quis estar, e acabei descobrindo o amor mais puro que conheci ate hoje, uma criança me amar e sorrir quando me vê até hoje me deixa sem palavras porque achei que seria incapaz de amar alguém tão verdadeiramente depois que minha mãe se foi.

Você não quer ter filhos é a pergunta que eu mais escuto nos últimos três anos, talvez seja o protocolo patriarcal já que eu passei dos trinta. Não conseguia me imaginar vivendo a coisa mais importante da vida de uma mulher sem os conselhos da minha mãe, ter um bebe e cuidar dele sem as dicas dela, ter um bebe e ele nunca conhecer a pessoa mais importante do meu mundo. Eu sempre tive planos de adotar uma criança, talvez porque eu saiba que esse momento seria menos doloroso para mim.

Demorei para compreender dentro de mim que uma mãe jamais desejaria uma vida assim para seus filhos e decidi viver novamente.

E aos vinte e nove anos eu procurei terapia, fui para psicóloga, admiti que meu luto não passava e me perdoei por esquecer como é a voz da minha mãe e como era seu abraço. Me perdoei por começar a viver meus sonhos, me perdoei por realizar coisas sem ela aqui, porque de fato ela nunca deixará de estar. Apesar que nunca me aberto com a psicóloga sobre esse assunto, ainda assim ela me disse uma vez que minha mãe com certeza queria que eu fosse feliz.

Hoje eu sei que posso realizar qualquer um dos sonhos que eu tinha guardado porque é o que as mães desejam aos seus filhos.

Hoje eu desejo um dia ter um casamento para planejar, quem sabe gerar um filho ou adotar. Com muito esforço hoje eu não tenho mais medo de expor sonhos que eu julgava não caber na minha história.

Talvez ter encontrado uma pessoa que me fez conseguir dizer isso em voz alta seja o primeiro passo para novos sonhos se concretizarem.


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